quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

De onde vem o dinheiro para pesquisa das universidades dos EUA?

Na imagem no alto, quadro de distribuição por fonte dos investimentos em pesquisa para instituições de ensino superior dos EUA. Fonte: Centro Nacional de Estatísticas de Ciência e Engenharia da Fundação Nacional da Ciência dos EUA. Imagem: AAAS/Divulgação.

Às vésperas de um novo congelamento de recursos, é preciso brecar a desinformação sobre investimentos públicos e privados


MAURÍCIO TUFFANI, Editor (publicado originalmente em http://www.diretodaciencia.com/2018/01/27/de-onde-vem-o-dinheiro-para-pesquisa-das-universidades-dos-eua/)
O governo federal confirmou na terça-feira (23) que nos próximos dias congelará parte dos recursos aprovados na Lei do Orçamento Anual da União para 2018. Além do bloqueio de recursos destinados às instituições de pesquisa, também são esperados os argumentos contrários a esse tipo de gasto com dinheiro público. Principalmente após toda a desinformação promovida em novembro pelo Ministério da Fazenda ao divulgar uma avaliação desastrosa sobre as universidades federais (ver “Relatório do Banco Mundial compara alhos com bugalhos no ensino superior”).

Têm sido recorrentes alegações de formadores de opinião de que nos países desenvolvidos praticamente toda a pesquisa, inclusive nas instituições de ensino superior, seria custeada por meio de recursos privados. E que as universidades públicas brasileiras deveriam seguir esse caminho. Mas isso não passa de conversa fiada. Não é o que acontece, nem mesmo nos Estados Unidos.

De fato, existem investimentos privados para pesquisa em faculdades e universidades dos EUA. No entanto, desde meados do século 20, a maior parte dos recursos aplicados em pesquisa nessas instituições, inclusive particulares, são públicos, principalmente do governo federal, segundo o Centro Nacional de Estatísticas de Ciência e Engenharia da Fundação Nacional de Ciências dos EUA (NSF). Os dados são obtidos por meio da pesquisa anual Higher Education Research and Development Survey (HERD), da NSF.

Nos anos 1960, os recursos federais chegaram a corresponder a 73% do total investido em pesquisa e desenvolvimento (P&D) em universidades dos EUA. A partir dos anos 1990, essa participação diminuiu, mantendo-se na média anual de aproximadamente 60%. É o que mostra acima, logo antes do início do presente artigo, o quadro do financiamento para ciência e engenharias (S&E) nas universidades do país, elaborado pela Associação Americana para o Avanço da Ciência (AAAS).


Verba federal

O quadro a seguir mostra a composição desse financiamento de 1990 a 2016, de acordo com suas fontes, em valores corrigidos para 2017.


Investimentos em pesquisa, por valor e fonte, para instituições de ensino superior dos EUA. Fonte: Centro Nacional de Estatísticas de Ciência e Engenharia da Fundação Nacional da Ciência. Imagem: AAAS/Divulgação.

Em dólares ajustados à inflação, o financiamento federal anual para a P&D nas instituições de ensino superior dos EUA aumentou de cerca de US$ 8 bilhões na década de 1960 para cerca de US$ 40 bilhões nos últimos anos.

Nesse mesmo período, o percentual da participação da indústria no total de aportes até dobrou, mas em um patamar muito menor, de menos de 3% para aproximadamente 6%, segundo o Programa de Orçamento e Política de P&D da AAAS.

Na verdade, nos Estados Unidos e em praticamente em todos os países, a maior parte do investimentos em P&D não só em universidades, mas também em instituições de pesquisa, é público, como mostrei anteriormente, em meio à discussão e à desinformação em torno do contingenciamento de recursos para ciência (“Investimentos públicos e privados para ciência: não é bem assim, Sardenberg”).


Resultados

Tão importante quanto desfazer essa desinformação é mostrar os resultados desses investimentos. Em sua edição de dezembro, a revista Pesquisa Fapesp mostrou que os dispêndios em P&D das universidades do EUA totalizaram US$ 72 bilhões, enquanto no Brasil, em 2015, o dado correspondente (então mais recente) foi de R$ 19,1 bilhões, equivalente a US$ 10,2 bilhões PPC (paridade de poder de compra).

A revista mostrou também que essa diferença se refletiu na produção científica registrada em publicações internacionais: 483 mil estudos dos EUA e 53 mil do Brasil em 2015. Confira nos infográficos da seção Dados da revista Pesquisa Fapesp em “Resultados dos dispêndios em P&D nas universidades”.

Apesar disso, enquanto no Brasil temos laboratórios sendo fechados e pesquisadores mudando de profissão ou indo embora, na China, onde a produção científica ultrapassou a dos Estados Unidos, o governo não só investe cada vez mais em pesquisa, mas também desafia seus pesquisadores a fazerem do país uma superpotência da ciência.

Leia também:
“China é o país que produz mais artigos científicos no mundo. Brasil é o 12º” (Daniela Klebis, Jornal da Ciência)
“Excelência acadêmica requer custeio público” (Fernanda de Negri, Marcelo Knobel, Carlos Henrique de Brito Cruz, Estadão).
Na imagem no alto, quadro de distribuição por fonte dos investimentos em pesquisa para instituições de ensino superior dos EUA. Fonte: Centro Nacional de Estatísticas de Ciência e Engenharia da Fundação Nacional da Ciência dos EUA. Imagem: AAAS/Divulgação. Imagem: AAAS/Divulgação.