terça-feira, 24 de outubro de 2017

Brasil aumenta produção científica, mas impacto dos trabalhos diminui

Nas últimas duas décadas, a produção científica brasileira cresceu de forma expressiva. Em 1998, nossos cientistas publicaram 11.839 artigos, número que colocava o país em 20º lugar no ranking dos que mais publicam. Quase vinte anos depois, com uma produção anual sete vezes maior, saltamos para 13º.
A relevância dos artigos nacionais, entretanto, não acompanhou essa marcha triunfal. Quando se usa como critério o número de vezes que cada estudo foi citado por outros cientistas, ou seja, seu impacto, o país perdeu terreno ao longo desse período e fica atrás de vizinhos como Argentina, Chile e Colômbia.
O levantamento, feito pelo biólogo da Unb (Universidade de Brasília) Marcelo Hermes-Lima a partir da base de dados aberta Scimago, mostra que o salto da produção brasileira veio acompanhado de uma diminuição de seu impacto internacional –ou de sua qualidade, na interpretação de Lima.
"A melhor forma de analisar a qualidade de um conjunto grande de artigos é por meio das suas citações", diz.
A classificação anual da base de dados utilizada por Lima computa as citações que cada artigo publicado em determinado ano recebeu –independentemente de quando a menção tenha sido feita. Em outras palavras, um trabalho publicado em 2007 terá tido mais tempo para ser citado do que um publicado em 2012.
Devido a isso, os números das citações por artigo de cada país vão diminuindo à medida que se avança em direção ao presente. A melhor forma de avaliar o impacto da produção de um país ao longo dos anos, segundo Lima, é descobrir quão perto ou longe ele está do 1º lugar em termos de citações por artigo.
Nessa comparação, nossa pesquisa ainda patina. Num exemplo, os trabalhos brasileiros publicados em 2006 foram citados, em média, 15,42 vezes. Já os da Suíça, o 1º lugar, tiveram, em média, 34,07 menções, ou 2,2 vezes o número nacional.
INTERPRETAÇÃO
Para Lima, a explicação para o aumento de publicações com redução do impacto, que se acentuou a partir de 2005, é a política exercida pela Capes, principal agência de fomento à ciência do país, durante as gestões petistas.
"Havia muito dinheiro e muita pressão para publicar. Expandiu-se enormemente a quantidade de cursos de pós-graduações e se exigiu dos estudantes que publicassem artigos para poderem defender seus doutorados. Vendia-se a ideia de que iríamos nos tornar uma potência científica", diz o pesquisador da UnB.
A cobrança e a pressa por resultados, segundo Lima, inviabilizaram a produção de trabalhos trazendo descobertas relevantes. "Viramos uma farra de publicação", afirma. Outro consequência dessa política, de acordo com ele, foi o fenômeno conhecido como "ciência salame", em que trabalhos maiores são "fatiados" em artigos de menor impacto.
Rogério Meneghini, professor aposentado da USP e coordenador da base Scielo, reconhece que a pressão do governo federal teve um papel no rápido crescimento da produção brasileira, mas considera também outros fatores para explicar o fenômeno.
Segundo ele, um ponto importante foi o aumento, ocorrido em 2005 e em 2006, do número de periódicos brasileiros nas bases de dados internacionais.
Desconhecidos, esses periódicos precisariam de um tempo para que os artigos veiculados neles começassem a ser citados com mais frequência.
De acordo com Meneghini, era natural que uma consequência disso fosse uma queda no número de citações por artigo no total da produção brasileira.
Segundo o coordenador da base Scielo, embora a citação por artigo seja um critério importante para avaliar a qualidade das publicações, ele não é o único. Daí não ser possível afirmar, apenas por ele, que a qualidade dos artigos tenha caído.
Fonte: http://m.folha.uol.com.br/ciencia/2017/10/1927163-brasil-aumenta-producao-cientifica-mas-impacto-dos-trabalhos-diminui.shtml?utm_source=facebook&utm_medium=social&utm_campaign=compfb